666-000: sempre brinquei que esse seria o número de telefone para chamar a ambulância e chegar ao hospício, ou algo parecido. Um lugar que ajude a explicar o que pensamos, passamos e, principalmente, vemos ocorrer ao nosso redor, pasmos. Penso em discar agora, aos 66 que completo, impressionada com a doideira geral
Os dias pouco anteriores ao dia de aniversário são sempre reflexivos, não sei se para você aí também. A memória de tudo o que já passou - e sobreviveu - fica muito mais nítida, talvez porque a gente se esforce mais em rever detalhes, pensar se hoje agiria igual ou até como poderia ter reagido à época, mesmo que não se arrependa de nada. Acabamos encontrando trechinhos mais especiais do que outros, sorrindo ao registrar vitórias, e batendo palminhas para aqueles em que conseguiu forças para superar. E foi assim, batendo muitas palminhas para mim mesma, que recordei do 666-000, o telefone doido da antiga brincadeira, de quando os telefones tinham só seis números e, claro, não existia o celular. 66 anos é coisa de quem vem lá do século passado, que parece tão longe, e às vezes tão perto. O tempo voa, mesmo.
Estamos aí. Sempre começando ou recomeçando, o que a esta altura da vida já dá boa canseira. Lembro da querida, geminiana também, Marília Gabriela que, do alto de seus agora 76 anos, conquistas, sucesso, resume em alto e bom som para quem quiser ouvir: “Envelhecer é uma merda!”
Mal ou bem, a verdade total. A frase é repetida com humor no seu imperdível espetáculo teatral “A Última Entrevista de Marília Gabriela” em cartaz até o fim de julho em São Paulo, ao lado do filho Theodoro Cochrane, genial, e onde se assiste a uma moderna e interessante revisão de vida e relacionamento, inclusive familiar. Gabi, uma mulher completa, vitoriosa, que canta, dança, representa, faz de um tudo, jornalista inesquecível e respeitada, que viveu grandes amores, sempre da forma que bem entendeu. Tenho por ela uma admiração e carinho que pouca gente no mundo me suscitou até hoje. E se ela diz que envelhecer é uma merda, quem sou eu para contestar?
É mesmo, principalmente para nós, mulheres. Vamos ficando invisíveis, e toda hora – vejam só – ainda temos de recomeçar, aprender a lidar com a solidão, com as perdas, mostrar nossas qualidades e o tanto que sabemos, e muitas vezes para quem não tem a menor ideia, gerações que chegam esquecendo, ou não sabendo, como as estradas foram rasgadas, cavadas, para chegarmos todos aqui. E o quanto ainda precisamos cavar, gritar, lutar para que haja respeito e que nos respeitem.
Daí sempre pensar no 666-000, a cada uma que presencio ou fico sabendo. Inclusive algumas que, digamos, me envolvem, sempre diferente dos meus pares. Nomeada, dependendo de por quem, como exótica, original, “estilosa!” (tem essa), “maluquinha” – pensam que palavras simpatiquinhas me passam despercebidas em seu significado de ataque. Sorrio e sigo, do alto de meu palanque, derrubando preconceitos faz muito tempo.
Me digam se sou eu que sou a “maluquinha” nesse mundo cheio de ódio, de violência brutal contra as mulheres, de descaso com a vida que acreditam na forma que se passa nas redes sociais. Guerras sanguinárias, descaso com a Ciência, Educação, com a vida e natureza, seguindo idiotas que se autodenominam influenciadores. Pior, “influencers”. Criam paraísos artificiais, e sem qualquer inteligência.
Deu linha. Só discando 6-6-6-0-0-0. Quem sabe qualquer hora alguém atende? Endereço Rota 66, entendeu?